Corretores da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2024 afirmaram que, no último sábado (23), foram orientados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) a descontar nota de quem:
- usou repertórios socioculturais "forçados" e sem ligação com o contexto (como menções a autores ou a livros que nada tinham a ver com o tema);
- copiou ou memorizou modelos pré-prontos de texto e acabou produzindo uma dissertação com ideias desconexas.
➡️Ao g1, sob condição de anonimato, membros da banca em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro relataram que, durante treinamentos presenciais oferecidos no sábado (23), o Inep foi categórico ao pedir que todos "fiquem de olho" nesses "truques" usados pelos alunos.
📝Em nota ao g1, o Inep não detalhou os pontos citados pelos corretores e não apontou como foi a orientação passada aos colaboradores, mas ressaltou que "todos os fatos, informações e citações apresentados no texto devem, necessariamente, estar vinculados à discussão proposta no projeto de texto".
Mas é preciso dizer que tais regras, embora não sejam mencionadas explicitamente no documento oficial sobre os critérios de correção, caminham no mesmo sentido de outras exigências do Inep, como a necessidade de coerência e de uso apropriado de referenciais teóricos.
“Pediram que a gente tenha atenção redobrada no que chamaram de ‘repertórios de bolso’, para verificar se realmente [as citações] estão sendo usadas de maneira produtiva”, disse uma das corretoras.
Outro professor, também membro da banca, afirmou que haverá, de fato, uma penalização a quem cometer essas práticas.
"Quando o repertório é genérico, que é o que acontece de um modo geral, os alunos, numa forçação de barra, dão um jeito de justificar [o uso dele]. Isso não vai mais ser aceito”, informou.
No treinamento, exemplos de repertórios "batidos", como poemas de Drummond, foram mencionados. Veja mais abaixo.
g1 alertou sobre modelos prontos e colas
Entre outubro e novembro, o g1 noticiou que:
- Modelos pré-prontos de redação do Enem estavam sendo vendidos por R$ 50 na internet. O candidato precisaria apenas memorizar o texto e preencher lacunas com o tema pedido cobrado na edição. As referências a autores, filmes ou livros são genéricas, justamente para servirem em qualquer ocasião. Exemplo:
Já ensinava Sócrates: “Os erros são consequência da ignorância humana”. Logo, é válido analisar as causas do ____ (tema)______ no Brasil.
Na ocasião, o Inep afirmou que, contanto que o candidato respeite as características formais esperadas de uma redação do Enem, ele não será prejudicado, já que "o critério criatividade não é objeto de avaliação do exame".
- Alunos postaram nas redes sociais que “colaram” na redação deste ano: levaram modelos assim para a prova, escondidos, para copiá-los na hora decisiva.
Neste caso, o órgão alegou que qualquer tipo de fraude leva à desclassificação do candidato “em qualquer etapa do exame”.
Houve mudança de regra aos '45 minutos do segundo tempo’?
Em outubro, semanas antes do exame, o Inep divulgou a Cartilha do Participante, que detalha a Matriz de Referência da redação do Enem. O documento lista aspectos que são avaliados pelos corretores e que contribuem para a construção da nota do candidato.
Nesse material, fica claro que o aluno precisa, entre outras habilidades, demonstrar que:
- sabe aplicar conceitos de diversas áreas de conhecimento ao desenvolver um tema;
- consegue selecionar, relacionar, organizar e interpretar fatos, informações e opiniões em defesa de um ponto de vista.
Ainda que a cartilha não mencione explicitamente os modelos prontos de redação ou os “repertórios de bolso”, evidencia que é essencial que o candidato apresente ideias coerentes, que se relacionem entre si. Uma ideia “solta”, que tenha sido apenas memorizada e encaixada ali a "fórceps", já tiraria pontos do estudante.
🚨O que aconteceu no último sábado, segundo os corretores, foi um reforço dessa regra e um “alerta” para os corretores.
“Eles [do Inep] estão começando a implicar com esses modelos de redação, estão ficando meio emburrados com isso. O que eles estão pedindo é que, mesmo que a pessoa tenha decorado um ‘repertório coringa’, que consiga usá-lo de maneira produtiva. Caso contrário, vai ser penalizada”, afirmou uma das corretoras ouvidas pela reportagem.
Outro professor, também membro da banca, relatou que o desconto será de 40 a 80 pontos. Uma “punição” maior, de 200 pontos, pode ser aplicada a quem usou apenas um repertório sociocultural no texto inteiro — e não o “encaixou” da maneira correta.
Durante o “curso” preparatório, segundo os corretores, o Inep mostrou, em uma apresentação de PowerPoint, alguns exemplos de textos das últimas edições que não deveriam ter recebido a pontuação máxima (de 200 pontos) na competência nº2.
São redações que foram bem avaliadas de forma equivocada, porque usaram repertórios “batidos” e sem contexto, como citações a “Utopia”, obra de Thomas More, e ao poema “No Meio do Caminho”, de Carlos Drummond de Andrade.
Se você, por acaso, mencionou uma dessas referências na sua redação, não se desespere: o Inep teria deixado claro, afirmam os corretores, que só será considerado um problema quando houver uso superficial delas, “sem que sejam costuradas ao texto”.
Fonte: G1
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