O contragolpe: como a polícia age para combater a “assessoria do crime”

Foto: Aline Massuca/Metrópoles

Anúncios de novas regras, recados codificados e enredos criados para favorecer criminosos. Com a expansão da internet, as redes sociais se tornaram um território confortável para que integrantes de facções reforcem sua atuação e moldem narrativas próprias.

Estruturado no Rio de Janeiro e espalhado por outros 25 estados, o Comando Vermelho (CV) transformou as plataformas digitais em ferramenta estratégica: comunicação rápida entre integrantes, divulgação de mensagens internas e ampliação da influência do grupo.

Diante dessa engrenagem de comunicação criminosa, a Polícia Civil do Rio de Janeiro (PCERJ) passou a travar uma segunda batalha: a disputa pelo controle da narrativa em um ambiente marcado pela desinformação.

O que antes era visto como um setor meramente administrativo ganhou função estratégica. A assessoria de comunicação da corporação foi reposicionada para informar a população, responder ataques e mostrar, em tempo real, o trabalho policial.

Na sede da instituição, na Rua da Relação, uma equipe de oito profissionais opera a estrutura criada para apresentar as operações sob um novo olhar. Segundo o chefe da assessoria, Iuri Cardoso, o Secretário de Polícia Civil, Felipe Curi, entende que comunicar bem virou necessidade.

“O Curi tem a visão de que existem duas guerras: a primeira no front, onde nossos policiais cumprem a missão. Mas a segunda, e mais importante, é a guerra da narrativa.”

Falando a língua do público

Para os profissionais da PCERJ, “furar a bolha” é essencial. A equipe, diversa em idade e experiência, monitora tendências, testa formatos e se reinventa para alcançar quem ainda não acompanha o trabalho policial nas redes.

Um exemplo ocorreu em outubro deste ano. À medida que a novela Vale Tudo se aproximava do final, o mistério em torno da trama dominou a internet e virou assunto nacional.

Aproveitando o engajamento, Mariana Albuquerque, coordenadora de mídias sociais, sugeriu usar o tema como gancho para impulsionar uma série sobre armamento ilegal que estava sendo produzida.

O resultado foi um vídeo que mesclou cenas da novela com alertas sobre porte ilegal de armas. A estratégia funcionou: o conteúdo viralizou e alcançou milhares de visualizações.

Quando a megaoperação deflagrada contra o Comando Vermelho em 28 de outubro deste ano foi classificada como a mais letal da história do Rio, as forças de segurança se viram diante de uma avalanche de desinformação. Boatos, versões distorcidas e narrativas fabricadas passaram a circular em velocidade recorde pelas redes sociais.

Diante do cenário, a equipe de comunicação da Polícia Civil precisou agir na outra ponta. A resposta tinha de ser rápida, clara e pública.

A corporação divulgou, então, um vídeo sobre a Operação Contenção no Instagram oficial.
As imagens mostravam moradores recolhendo roupas camufladas usadas por criminosos durante confrontos e traziam informações sobre a atuação do grupo na instalação de barricadas e no tráfico de drogas.

O conteúdo viralizou: foram 14,9 milhões de visualizações. A publicação ainda impulsionou o crescimento do perfil, que ganhou milhares de novos seguidores

Traficante e assessor

As divulgações das facções não são simples mensagens elaboradas e compartilhadas por qualquer um. No centro das células criminosas, os traficantes são “escalados” para funções específicas.

O traficante Washington César Braga da Silva, de 35 anos, um dos alvos da megaoperação deflagrada no dia 28 de outubro que permanece foragido, é apontado como uma espécie de “gestor do crime”.

Conhecido pelo codinome “Grandão”, o faccionado tem a função de gerir o crime no Complexo da Penha e elaborar comunicados disseminados na web.

As investigações apontam que ele também monta escalas de plantão na segurança dos pontos de venda de drogas, define normas de comportamento da quadrilha e estratégias de defesa dos faccionados, além de gerenciar as finanças do crime, organizando os pagamentos dos traficantes.

Fonte: Metropoles